quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Prêmio Ser Autor


Em 2010, nossa Escola participou do concurso I Prêmio Ser Autor, promovido pela SEE/SP em parceria com a Câmara Brasileira do Livro, e tivemos a grata satisfação de termos dois trabalhos selecionados para compor a antologia do concurso, lançada durante a 21ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo. Os textos selecionados foram o poema Será um belo dia, de autoria dos alunos Gabriel dos Santos Rodrigues e Luís Guilherme dos Santos, e o texto de memória O gesto que constrói, da professora Sueli Cabral.
Parabéns aos nossos escritores!


Será um belo dia

Um belo dia para nascer

Um belo dia para viver

Será que o belo é dia

Ou será que o dia é belo?

Será que o dia vai nascer?

Será que o belo sobreviverá?

Pode ser um dia de tempestade

Ou uma neblina de tristeza

Não importa como esteja o tempo lá fora

Se a luz de cada dia

Amanhece em nossos corações.

Gabriel dos Santos Rodrigues e Luís Guilherme dos Santos


O gesto que constrói

Vejo-me mais uma vez naquele espaço tantas vezes revisitado, onde, naquele ano de 1995, funcionou a turma B, da 6ª Série. É incrível, mas consigo até mesmo ouvir o ruído saudável daquela moçada, que tanto me cativou e de quem eu pude exigir tanto quanto me doar.

Aconteceu ali, naquele espaço restrito, eu, recém voltada à Unidade Escolar, ele não tinha mais que onze ou doze anos, o que sucederia entre nós, imprimiria, em nossa alma para sempre, marcas profundas e, ainda, atrelaria um gesto de cumplicidade entre uma professora e seu aluno. Era esse um daqueles raros momentos de nossa trajetória profissional, quando na nossa interação com o outro, em vez da razão, deixamo-nos conduzir pela sensibilidade, por isso não houve arranhões reais, mas, as ranhuras do gesto recíproco fizeram seus entalhes indeléveis em nossos corações, no meu e no dele, o que seria sabido anos mais tarde.

Logo que retornei, em agosto de 1994, percebi que existiam poucas obras de literatura infanto-juvenil, o que motivou uma verdadeira “batalha por livros”, que aumentou, sobremaneira, o acervo da Biblioteca. Então, para coroar a campanha e incentivar à leitura, em 1995, propus à Sexta Série, a produção de livros em equipes, a Sétima soube do plano e, por iniciativa própria, engajou-se no projeto. Tamanho foi o envolvimento de ambas as turmas que quase revejo todos os alunos lendo, lendo, relendo, devorando cada história e novamente me sugerindo leituras para companheiras na viagem de volta ao futuro.

Comprometidos, mantiveram-se mais de um bimestre, absorvendo o teor das obras adquiridas, depois, foram escrevendo, reescrevendo e compondo as suas obras literárias, que traziam vez ou outra para minha revisão. Por não haver naquele tempo muitos computadores, alguns autores envolveram inclusive pais e mães, para digitarem na “máquina de escrever”, as produções já prontas e revisadas e até mesmo costurarem as páginas dos livros. Outros encomendaram, a quem possuía computador, impressão de capas coloridas. Foi tudo tão surpreendente, que poderia eu ficar dias e dias revendo cada detalhe ocorrido.

Terminado o trabalho proposto, retorno àquele instante inesquecível, no qual estancara. Era ele o momento da avaliação final das obras, respeitadas conforme a capacidade de produção de cada um. Fiquei boquiaberta, encantada com tudo que fora produzido pelos “meus mais caros escritores”. Mas entre todas, lembro-me, especialmente, de uma, a feita por ele, meu cúmplice, menino, na época, até bastante tímido. Revejo-me perguntando, se ele havia morado na cidade, cujo cenário descreveu com tanta propriedade, com tantos detalhes para abrigar a sua trama. Ouço-o dizer que não, que nem a conhecia e, noto que quase não se conteve em si pelo simples elogio lançado em forma de indagação. Pularia em comemoração, não fosse a timidez. Foi um momento de êxtase absoluto, de felicidade infindável, aquilo que eu vi refletido nele, ele se conteve em seu ímpeto de saltar, mas seus olhos deram cambalhotas, em uma manifestação de alegria explícita, que só eu e mais ninguém presenciou. Afinal, ele conseguira passar para mim, sua leitora imediata, a sensação de estar correndo pelos becos, vielas e ruas, os quais ele tão bem descreveu, viu-me no cenário, sendo mais um personagem investigativo da história por ele criada. Veja que ironia, vi nos olhos de meu aluno, não só a alegria de ser um leitor, mas o orgulho de ser também um escritor, que teve a oportunidade única de contemplar nos olhos de sua leitora, a capacidade que ele próprio desconhecia até aquele instante ímpar, que o inebriara.

O tempo não parou, o menino ficou moço e deixou a escola, a qual retornara tempos mais tarde, como voluntário no programa “Escola da Família”, foi quando eu soube, que assim como eu, ele não havia se esquecido daquele episódio e, em uma reunião, apresentando-se aos demais presentes dizendo a que voltara, em um belo depoimento, disse a todos, só que desta feita, sem a timidez que lhe era peculiar, que o seu gosto pela leitura havia sido despertado por mim, citou até o nome da obra e do autor, impulso inicial. Confesso, sem modéstia, que fiquei muito vaidosa, pois nem sempre podemos ter a dimensão exata de nossos atos, de nossos gestos. Naquele dia, cuja data perdeu-se na minha memória, mais uma vez, pude contemplar no espelho dos olhos do meu aluno, o gosto concretizado e a alegria de ser um leitor, cujo mérito também se deveu àquele momento de sensibilidade e às palavras de luz nele proferidas.

Sueli Cabral